Espaço Psi-Saúde Site & blog da psicóloga Thays Babo

19/11/2013

Blue Jasmine: uma versão agridoce de Allen


Está em cartaz Blue Jasmine, novo filme de Woody Allen, que tem Cate Blanchet como protagonista. Se você for assistir imaginando que é uma comédia, vai se surpreender. O riso pode até vir , de nervoso – mas não é nunca fácil. Aliás, muna-se de paciência com as gargalhadas fora de hora. Parece que cada vez mais o público não está preparado para aprofundamentos. E, em se tratando de um filme que saia do que era esperado, parece que isto se agrava.

Se não quiser saber muito sobre o filme, melhor parar a leitura por aqui.

Certamente o diretor americano faz uma crítica à sociedade americana e à recente crise pela qual o país passou – e está passando. Pode-se, no entanto, ampliar o olhar e pensar, independente de tempo, geografia ou economia, nas pessoas que – em qualquer tempo ou lugar – vivem despreocupadamente, tento como únicas preocupações a aparência e ostentação. Muitas acreditando em tudo o que lhes convêm, sem que parem para questionar nada.

Blue Jasmine mostra a vida nababesca de pessoas que apostam alto, mas não ensaiaram, sequer cogitaram, perder. A protagonista, interpretada por Cate Blanchet, sempre viveu fora da realidade. A começar, pelo próprio nome, que adota por ser mais adequado à sua autoimagem. Jasmin não consegue se adaptar à virada que a vida dela dá. Até tenta – mas, de novo, continua fugindo à realidade dos fatos. E – como na vida real – ao continuar vivendo de mentiras, perde uma grande chance de conseguir se reestruturar. Ou de não se desestruturar de vez.

Na vida real, quando a roda da fortuna gira, nem todo mundo que está no alto consegue se sentir confortável, ao descer. Algumas pessoas surtam. Outras suicidam. E o filme mostra não só isto, mas também a dificuldade de se recomeçar, do zero, quando se está instalada confortavelmente em uma posição pretensamente segura. Há que se ter resiliência. Jasmine não tem. É possível que o diretor também tenha querido fazer uma crítica ao excesso de medicamentos que se usa atualmente:tal como a sociedade que vive dopada, é assim que Jasmine tenta enfrentar as condições atuais. Em filmes mais antigos do diretor, talvez a personagem recorresse às sessões de psicanálise, tentando ‘elaborar’ o que passou. Neste, toma descontroladamente seus comprimidos, tanto nos momentos tristes quanto nos felizes.





Blue Jasmine, além da questão sobre as reviravoltas que a vida dá e como sobreviver a elas, possibilita também a discussão sobre como duas irmãs (adotivas, que sejam, mas criadas pelos mesmos pais) podem ser tão diferentes na forma de enfrentar a vida. Aliás, a irmã de Jasmine merecia um filme à parte… 😉

Enfim, neste filme, Woody Allen não doura a pílula, dizendo que tudo é fácil ou superável quando em família. Às vezes, pode mesmo ser exasperador.

Aguardo seux comentários!

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Thays Babo é psicóloga e Mestre em Psicologia Clínica em Puc-Rio.

08/11/2013

Nadando contra a corrente

O drama Contra corrente, co-produzido pela França, Colômbia e Peru, conquistou vários prêmios e em especial o de Prêmio Popular no Sundance Festival (2011). Também faturou o Prêmio Popular no Festival de Cinema de Miami.

O filme conta, com um toque espiritualista, a história do amor proibido entre Santiago e Miguel.

Diversidade sexual

Espero que você não seja do tipo que se choca com a diversidade sexual. Ao contrário do que muitos conservadores pensam, ela sempre existiu. Se for este o seu perfil, e não quiser repensar seus juízos de valor, melhor procurar outro post.

Nos grandes centros urbanos, nas elites intelectuais, tem-se um discurso mais pró-diversidade. Porém, o preconceito ainda sobrevive.

Em pleno século 21, há ainda quem ataque os homossexuais ou bissexuais, ou qualquer outra orientação sexual diferente da sua.  

Os que defendem a homofobia apresentam um discurso moralizante, ‘naturalista’, fechado em si mesmo e justificando-se na “normalidade” ou na natureza. Tudo isto é facilmente derrubável, se a pessoa tiver predisposição para o raciocínio e para as evidências. Mas, indo em frente, vamos à discussão do filme, começando pelo trailer.

Sinopse 

Copiada diretamente do site do Arteplex Unibanco

Miguel é um homem respeitado na vila de pescadores onde vive com sua esposa Mariela, que está grávida do primeiro filho do casal. Embora viva bem com a esposa, Miguel tem um caso secreto com um artista forasteiro, Santiago, chamado pelas costas pelo povo do vilarejo de `Príncipe Encantado’. Quando a história toma um rumo sobrenatural, Mariela começa a questionar Miguel, que eventulmente terá de decidir se é homem suficiente para assumir a sua sexualidade. A fotografia de Maurício Vidal revela a beleza pouco conhecida da costa peruana, que serve como pano de fundo para as emoções vividas pelos três protagonistas, interpretados por atores sul-americanos de primeira linha. Em seu filme de estreia, Javier Fuentes-Leon arrebata o espectador que facilmente se deixa levar por esse romance transcedental com sensibilidade latina.

Sofrimento

O filme aborda um tema muito sensível. Não ‘demoniza’ ninguém. Mostra o sofrimento da esposa e a própria incompreensão dos sentimentos do protagonista, Miguel.

Há romantismo, há toques de humor, mas o drama da divisão de Miguel, não é aprofundado.

Antes mesmo de ver o filme, você já pode imaginar o impacto de um caso clandestino homossexual, vindo à tona, vivido em uma colônia de pescadores. E os desdobramentos que isto poderia gerar.

Impressões 

Tendo estudado a bissexualidade e entrevistado pessoalmente vários bissexuais, fiquei, ao sair da sessão, com a sensação de que, mais uma vez, o filme deixa de fora a a existência desta orientação sexual.

Fica-se na escolha polarizada: ou uma coisa ou outra. Não se sabe como a relação entre Santiago e Miguel se estabeleceu e assim o protagonista não consegue entender o que se passa com ele.

Miguel não reitera seu amor pela esposa, só mostra que quer continuar casado e com a família – mas parece ele mesmo ter dificuldade de entender.

Pode parecer que a escolha é pelo conforto de levar uma vida hétero – crítica que é muito comum em relação a quem não se assume bi. Isto contribui para a bifobia. O público pode ficar com esta dúvida, acreditando que Miguel é apenas mais um que se casou para esconder (negar) sua homossexualidade.

Daí para se solidarizar com a esposa e achar que ele é um falso, não custa. Ou seja, várias questões que angustiam bissexuais, como Miguel, ficam sem aprofundamento.

De positivo, mostrou que ser bissexual não implica em ‘não ser homem’, ‘macho’ ou não honrar seus compromissos e promessas.

Resumindo, a bissexualidade não é discutida. Lembrou-me o filme Minhas mães, meu pai em que a personagem de Julianne Moore parece ter apenas ‘surtado’ ao se relacionar com um homem.

Enfim, mais um filme em que a bissexualidade não é considerada. Não se abriu uma discussão e a ‘culpa’ recaiu apenas no homem hétero.

Se a discussão sobre as orientações sexuais te interessa, vale a pena procurar assistir a este filme. E deixe seu comentário aqui.
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Mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio, na linha de Família e Casal, com formação em Terapia Cognitivo-Comportamental e Extensão em Terapia de Aceitação e Compromisso. Antes de ser psicóloga, fui publicitária – na era analógica. Atualmente, faço formação em Terapia do Esquema,

Atendimento a jovens e adultos, em terapia individual, de casal ou pré-matrimonial em Copacabana. Durante a pandemia, os atendimentos são prioritariamente online.

Aposentadoria: uma fase nova

 
Enquanto se é jovem, a maioria das pessoas sonha com o dia da aposentadoria para, enfim, fazer aquilo do que se realmente gosta . Mas, quando chega a hora de dizer adeus ao mundo do trabalho (e chega muito mais rápido do que se imagina, na juventude…), os sentimentos são bastante diversos. Muita gente se deprime, sentindo-se como se tivesse se  despedido da vida… Há quem se entregue e envelheça (fisicamente) em pouco tempo o que não envelheceu nos últimos dez anos.

É compreensível: no Brasil, em geral, ao se aposentar, a perspectiva não é nada boa. Com um sistema de saúde público e previdência precários, poucas pessoas têm a tranquilidade de ter previdência privada, que possibilitaria manter o padrão de vida no nível em que se tinha antes. Custos com saúde aumentam e, com a expectativa de vida aumentando , pode-se enfrentar um grande baque financeiro.

Além das dificuldades econômicas, a pessoa começa a questionar o sentido da própria vida, o que fez ou deixou de fazer. Se renunciou a muitas coisas muito importantes, ou se as adiou, e percebe agora que não conseguirá realizá-las, pode deprimir. Pode perceber que as coisas pelas quais se sacrificou não valeram a pena.

Soma-se a isto que, por vezes, também terá de enfrentar o preconceito na própria família frente ao rótulo “aposentado/a”. Em algumas, somente as pessoas que são economicamente ativas são respeitadas. Parando de produzir, não terá mais voz. Ou poderá virar simplesmente um/a cuidador/a dos netos – algo que pode ser muito prazeroso, mas não para todos. Ou talvez nem tanto quando vira obrigação diária.



É muito comum que a pessoa que tinha um ritmo acelerado ou até cargos de chefia sofra ao ter de adotar um ritmo de vida mais lento. Ao invés de se adaptar, tenta se impor, não conseguindo se adequar ao ritmo das outras pessoas. Com isto, pode gerar alguns conflitos desnecessários, apenas por estar com a autoestima em baixa.

Se por um lado há um “boom” de atividades para a terceira idade, as empresas no geral ainda não se preocupam em preparar a pessoa para se aposentar. Às vezes apenas se preocupam com pacotes para motivar a pessoa a se retirar do mercado de trabalho o quanto antes. Dão um tapinha nas costas quando o/a funcionário/a completou o tempo de serviço e … tchau! As questões que se apresentam para quem se aposenta poderiam ser tratadas a nível corporativo. Porém, sendo responsáveis por nossa qualidade de vida, convém não esperar pela mudança de mentalidade e por decisões organizacionais.

Portanto, fica a sugestão: a proximidade da aposentadoria é um bom momento para começar um processo psicoterápico. Quem ainda não pensou no que vai fazer com as horas que terá disponíveis, pode se preparar. É um bom momento para vislumbrar melhor as muitas possibilidades que se abrem à frente. Encarando as necessidades reais e entendendo melhor as restrições que possam surgir a qualidade de vida na aposentadoria pode ser muito boa.

Recentemente, um filme francês – “Os belos dias” – tratou do tema. Junto com o questionamento sobre o que fazer com as horas que sobram, como combater a depressão tão recorrente neste caso, o filme trouxe também uma interessante questão: a sexualidade do idoso. Sim, é bom ir vencendo os preconceitos quanto à vida sexual na terceira ou quarta idade: com a expectativa de vida se alongando, por a aposentadoria sexual deveria vir cedo?

Vale a pena conferir para repensar velhos conceitos. A seguir, o trailer…





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Thays Babo é psicóloga e Mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio.

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