Espaço Psi-Saúde Site & blog da psicóloga Thays Babo

14/10/2013

Oniomania – o que é?

Você sabe o que é oniomania? Oniomania é a compulsão por compras. Este comportamento obsessivo,   desenfreado e sem controle, traz inúmeros problemas para quem sofre deste transtorno e às vezes para seus familiares.

Com a proximidade da Black Friday, fique atento(a) ao seu comportamento. Em tempo de pandemia, as tentações agora pegam você dentro de casa.

Emoções ligadas à oniomania

Se você sofre de compulsão por compras, provavelmente tenta esconder isto das pessoas próximas. O problema é que esconder faz com que sua vida financeira possa chegar  a um nível insuportável. 

O filme Becky Bloom retrata de forma divertida o drama de quem sofre deste problema. Não se engane: na vida real pode chegar a ser trágico, se não houver ajuda especializada e apoio das pessoas próximas

Becky Bloom e a compulsão por compras

Adaptado para o cinema, a partir do livro  “Confessions of a shopaholic“, Becky Bloom  pode servir como filmoterapia. A história é transferida de  Londres para  Nova Iorque. Por quê?

Talvez NY seja a  cidade mais tentadora para compras, mesmo para quem não é excessivamente consumista. Afinal, o consumo nos Estados Unidos é muito estimulado e poucas pessoas percebem o quanto é mesmo exagerado.

Como muitos  shopaholics – ou oniomaníacos -, Becky mente para disfarçar sua situação.

Young woman walking with shopping bags, low section

Na vida real, como é?

Sendo uma comédia romântica, a protagonista resolve de maneira fácil o problema. De certa forma,  a compulsão é justificada, com origem na relação com a mãe, quando era pequena, pelas suas necessidades não atendidas.

Talvez pudéssemos dizer que Becky tinha o esquema de defectividade e vergonha bem como o de necessidade de admiração e reconhecimento.

Na vida real, somente uma psicoterapia pode ajudar a identificar a origem. E, o mais importante, a mudar o comportamento. O primeiro passo é se conscientizar de que é um problema. 

Quem tem compulsão por compras sofre muito – e tem vergonha de falar sobre o assunto. Assim, as pessoas próximas podem se envolver no problema, às vezes tardiamente.

 Os relacionamentos  são afetados

A vida pessoal é prejudicada  como um todo. Ao comprometer a saúde financeira e o patrimônio relacionamentos amorosos podem acabar e podem acontecer cisões familiares.  

Assim, muito frequentemente a oniomania é acompanhada de ansiedade e/ou  depressão. Estes transtornos podem ser preexistentes ou agravados pelos comportamentos compulsivos. Também há  pontos em comum com a dependência química.

O endividamento pode levar a família a intervir, se tem acesso às finanças da pessoa que se endivida. Às vezes a família tem de interditar – o que no Brasil não é um processo fácil, podendo levar meses.

Como todas adições, quando acha que não tem solução, ou por vergonha, a pessoa em desespero pode até tentar o  suicídio.

Como tratar

Na vida real, a ajuda profissional especializada é a forma mais segura da pessoa conseguir superar o problema ao identificar o que a compra significa para aquela pessoa. 

Às vezes será preciso o auxílio de um profissional de contabilidade, outro de direito, além da ajuda psicológica, para entender  as emoções envolvidas  na compra e na pós-compra. O que impulsionou à compra e ao endividamento? 

Questões paralelas ao consumismo

Outro tema, não abordado, atravessa o filme: o lixo gerado a partir do excesso de consumo, tema para outro post.

E é bom destacar que, apesar de a onomania ser estatisticamente mais frequente em mulheres, homens também sofrem deste transtorno.

Mas não  necessariamente a compulsão será por consumir moda. Podem ser aparatos eletrônicos, inclusive.

Prevenção

Muitas pessoas que sofrem de oniomania  não tiveram uma educação financeira. Hoje existem cursos direcionados a crianças e adolescentes. Caso você tenha filho/a/s,  ensine-a/s a  ser financeiramente responsável.

Passe bons valores também, com menos estímulo ao consumismo. 

Algumas atitudes radicais podem ser tomadas para prevenir maior endividamento: cancelar cartões de crédito e  reduzir o limite do cheque especial , por exemplo.   

Se você conhece alguém que sofre disto, ao invés de julgar, aconselhe a procurar ajuda especializada. 

Veja a entrevista com uma psicóloga e um psiquiatra que esclarecem melhor este tipo de compulsão.

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Thays Babo (CRP 05/23827) é  Mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio, com formação em Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) pelo CPAF-RIO e extensão em Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) pelo IPq (USP). Atualmente, cursa a formação em Terapia do Esquema, com término previsto para setembro de 2021. 

Atende a jovens e adultos em terapia individual, de casal e pré-matrimonial. Durante a pandemia, a  maioria dos atendimentos é feita  on-line

04/10/2013

A Origem, o filme


Ao sair do cinema, fiquei por dias sob o impacto da imagens de A Origem (Inception). A estas alturas, é improvável que você assista este filme no cinema, passado tanto depois do lançamento. Ver no computador ou mesmo em uma televisão de tela gigantesca, em casa, não tem o mesmo impacto. O visual remete à arte, a Escher, ou seja, perde muito quando visto numa telinha em casa, por maior que seja a sua. A música, que em alguns momentos oprime, também pede um surround.

Eu falei em Escher. A imagem abaixo ajuda a esclarecer porquê e reforça que o filme ‘pede’ uma telona.



O roteiro e direção são de Cristopher Nolan. Mesmo não sendo conhecedora profunda do roteirista-diretor, assisti a seus Amnésia, Insônia , Batman – ao 1º, que me deixou insone – e O Grande Truque. Por esta filmografia, qualquer um já percebe seu prazer em confundir os espectadores por muitos minutos até se revelar, no final. Ponto pra ele. Se você não se importa de perder o impacto de assistir ao filme de forma pura, com total surpresa – o que eu aconselho, muito – vá em frente. Se não, pare agora e só retorne depois da sessão.

Ok, você continuou , então vamos lá.

O elenco é estelar. Mesmo não sendo fã de Leonardo di Caprio (trauma por causa de Titanic?), reconheço que ele está bem, mais maduro, e convincente como alguém atormentado pelo passado e pelos erros cometidos. O sempre impecável Michael Caine tem uma rápida participação. Marion Cottillard interpreta sua esposa, morta, Mel. Os demais – Ellen Page (Juno), Tom Hardy (500 Dias com ela), Tom Berenger, Cillian Murphy, bem como o sempre enigmático Ken Watanabe – estão em sintonia fina. A história não é nada simples: Cobb é um especialista em adentrar a mente dos outros para roubar ideias. Há uma técnica que permite isto – não há muitos dados sobre o processo – desde que as pessoas adormeçam profundamente. No sono profundo, sugestões são feitas, a realidade é outra, e o tempo não é como o da vigília. Quem assistiu a Matrix verá semelhanças, como uma certa referência a conceitos budistas.

Em algumas cenas, a estética lembra games. O objetivo do jogo? Convencer um herdeiro de uma empresa gigante a dividir o seu negócio para que o contratante de Cobb tenha maior lucro. Para isto, ao invés de roubar uma ideia, Cobb terá de implantá-la. Assim, poderá recobrar sua liberdade e voltar para casa. Mas se Neo, de Matrix, era um herói, podemos dizer que o caráter de Cobb é realmente ambíguo. Ele é um herói às avessas. Para conseguir entrar no labirinto do sonho, tem de se cercar de outras pessoas que o ajudem a entrar e sair. Não deve ser por acaso o nome da personagem de Ellen Page: Ariadne, famosa na mitologia por ter ensinado a Teseu como escapar do labirinto do Minotauro. Ariadne, na mitologia, se apaixona por Teseu. No filme, fica o clima no ar – no seu empenho para ajudar Cobb a se livrar da sua culpa, relacionada com a morte da esposa, que fica presa em sua mente, sempre voltando e sabotando o que planeja, conscientemente. Fiquei com a impressão de que pode vir A Origem 2 pela frente.

O que será que nos faz torcer por heróis tortos? Será que é por que tentam se redimir dos erros passados? Ou por que tudo que querem é voltar às suas casas, como Ulisses? E por que tortos? Ora, quem gostaria de ter uma ideia roubada ou implantada? Onde fica a liberdade do sonhador? E onde está a ética? Se a gente já se incomoda tanto com as mensagens subliminares, a ponto de proibi-las, como não se indignar com a possibilidade de implante? E não é que, de certa forma, já vivemos isto com propagandas nos cercando em todos os lugares, onde antes havia vazio e espaço?



Então, não tem jeito, a gente se solidariza e torce pela redenção do bandido que vira mocinho – ainda que a sua vitória seja conseguir terminar, com sucesso, um ato tão anti-ético como implantar uma ideia. Para isto, adentra a mente da vítima e vasculha sua relação com o pai, que acaba de morrer. Manipula e transforma esta relação e, assim, garante sua liberdade. Cobb é corroído pela culpa pelo passado, sem se preocupar com o que faz no presente. E , como a gente sabe, culpa não adianta para nada: só nos prende ao passado, impedindo o crescimento.

Os sonhos induzidos parecem games, em que se tem um certo nível de controle. E é a margem de descontrole que faz de A Origem um filme de ação também. Nolan não foge ao script e ‘implanta’ cenas de de perseguição e luta, onde não se sabe mais quem é bandido, quem é mocinho. Eu sempre tinha achado que era incompetência minha, mas pelo que ouvi de comentários, não estou sozinha… 🙂

Como sonhos não são fáceis de explicar, porque fogem à linearidade, que a maioria de nós preza, este filme também nos deixa zonzos no início. Faltam informações sobre como ideias podem ser realmente implantadas. É um daqueles em que se ouve muita gente na saída comentando que não entendeu… O filme mostra bem a relação entre a mente, seus pensamentos, sentimentos e comportamentos. E, o que é assustador, a possibilidade de manipulação de mentes.

Para comentar, basta clicar no título desta resenha. Vai abrir uma caixinha aqui embaixo. Obrigada pela participação, volte sempre!

P.S: O filme recebeu em 2011 os Oscars de Melhor Fotografia, Melhores Efeitos Especiais, Melhor Mixagem de Som e Melhor Edição de Som , tendo sido também indicado a Melhor Filme.


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Thays Babo é psicóloga e Mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio, associada a ATC-Rio e atende no Centro.

Desconecte-se…


Em 2009, uma pesquisa realizada  pela firma Harris Interactive, por encomenda  da Intel, mostrou o papel de destaque da internet na vida dos adultos americanos. Foram entrevistados mais de 2 mil pessoas e uma das perguntas era se preferiam ficar sem internet ou alguma outra atividade por duas semanas. Navegar na rede foi a opção primária de muitos adultos, confrontada com  o sexo:  46% das mulheres e 30% dos homens abririam mão de relações sexuais por duas semanas para não ficarem sem internet.



E 67% dos adultos entre 18 e 34 anos declararam preferir internet a assistir televisão. A idade possivelmente influenciou nas respostas, apesar de não se poder comparar as faixas etárias estabelecidas: 39% dos homens (de 18 a 34 anos) abririam mão de sexo; entre mulheres de 28 a 34 anos a conexão seria a escolha de 49%, e de 52% entre mulheres de 35 a 44 anos. É bem verdade que hoje se pode assistir tv pelo computador…

De acordo com o site Digital Trends, 65% dos entrevistados disseram ser impossível viver sem acessar e 71% que é importante possuir dispositivos conectados à rede.

A pesquisa não era só sobre relacionamentos, enfocando também a economia, hábitos de compra  etc. Passados 4 anos, os percentuais de preferência pela rede devem ter aumentado. Surgem cada vez mais críticos ao excesso de conectividade. As redes sociais e uma série de aplicativos mudaram os relacionamentos e têm trazido mais instabilidade – o que acaba aumentando as angústias e ansiedades pessoais. Não sei ainda de pesquisa semelhante relativa ao internauta brasileiro, mas creio que o resultado não seria muito diferente. Afinal, é sabido do enorme interesse pelo mundo virtual que se encontra em terra brasilis. E hoje os celulares facilitam o acesso à rede e as pessoas praticamente vivem online. Perdem muitas vezes o que se passa ao lado delas, na ânsia de compartilhar o momento, distanciando-se dele.

A idade é uma variável importante na análise desta pesquisa. Pessoas mais velhas,  que já experimentaram sua cota de relacionamentos e separações, podem estar com preguiça de lidar com todas as frustrações que certamente os contatos presenciais trazem. Ficam protegidas em suas casas, vivendo a fantasia mas se poupando do desgaste, do desperdício de energia, do risco de se expor na vida real. Não foi divulgado também o percentual de cada estado civil dentre os  que preferem a internet ao invés de TV (outra virtualidade) ou mesmo ao sexo.

Este panorama  angustiante remete a filmes como Denise está chamando e predispõe a uma explicação genérica. Antes de se abismar e sair  jogando pedras na vida “virtual”, seria bom perguntar: “que carências a internet supre?”, “Que vantagens ela traz”? “Que dores e prazeres impede?”, “O que ela ensina?”.  Logicamente,  cada pessoa que responde que prefere a virtualidade tem um histórico, maior ou menor, mais sofrido ou mais leve, que ficou de fora da pesquisa.

O fascínio do componente ‘fantasia’ sobre a realidade é óbvio. Então seria o caso de se analisar que realidade é esta, que se quer evitar. Outro aspecto é se, no final das contas, a internet não é o canal em que, para muitos, a comunicação é possível, se dando de alma a alma. Um espaço onde se abandonam as máscaras (no jargão junguiano, persona)  e com isto pode-se ser realmente quem é.

Cabe se perguntar: ‘o que procuro’, ‘de que me defendo’, ‘o que evito’, ‘o que impeço de bom’? Ou ainda, ‘será a  internet é a única forma possível de poder me relacionar?’ Respostas a estas perguntas podem ser difíceis de encontrar, ou dolorosas. E talvez tenha-se aí uma indicação clara para psicoterapia. Afinal, a vida espera lá fora.

Ao mesmo tempo, é importante conhecer o que os estudiosos sobre internet falam sobre  relacionamentos que surgem mediados pelo computador. Adotando uma visão “apocalíptica”, desprezaremos conhecimentos importantes, apenas por uma postura reativa a uma nova modalidade de comunicação. O mesmo horror deve ter surgido quando o telefone foi criado. E também o rádio, a televisão…

Porém, ter fobia às novas tecnologias não é também indicado. Pode, inclusive isolar socialmente a pessoa, que também pode perder boas chances profissionais. Então, voltando aos antigos, talvez a máxima seja: “nada em excesso”. Portanto, desconecte-se de vez em quando, faça retiros da tecnologia e observe como seu dia pode render melhor e seus relacionamentos olho no olho podem melhorar também.

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Thays Babo é psicóloga, Mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio, associada à ATC-Rio. Atende no Centro (Rio – RJ)

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