Espaço Psi-Saúde Site & blog da psicóloga Thays Babo

04/06/2012

Pendências amorosas

“É desconcertante rever o grande amor”, cantava Chico Buarque em Anos Dourados. Quem já teve um grande amor muitas vezes se sobressalta ao reencontrar alguém que tenha sido muito significativo. E é esta situação que “Apenas uma noite” (Last Night) aborda, com os seus impasses e a dificuldade de se comprometer ou renunciar a outras possibilidades.

Joanna (Keira Knightley) e Michael (Sam Worthington) formam um jovem casal, morando em Nova Iorque que de repente se vê em uma crise, despertada pela desconfiança de Joanna quando conhece uma nova colega de trabalho de Michael, Laura (Eva Mendez), com quem ele terá de fazer uma viagem de negócios programada. Com a autoestima abalada, Joanna reencontra, por acaso, seu ex-namorado, Alex (Guillaume Canet) , justo no dia seguinte à discussão com o marido e sua viagem. 

(Como sempre, aviso antes de prosseguir: se quer assistir ao filme sem saber muito, melhor parar aqui e voltar depois… )

Ao longo do filme, vemos que os personagens não são estanques, todos quatro têm suas fragilidades e carências, não são monstros insensíveis, ‘predadores’. Talvez idealizem demais sobre relacionamentos que não atingiram os 100 dias – período de teste? De certa forma, o que decidem, o que escolhem, o que falam ou o que omitem pode despertar carinho ou pesar por eles. A vida se constitui de escolhas, nem sempre definitivas, nem sempre as melhores. Em alguns momentos, o filme é tão angustiante quanto Closer. Pode-se chegar ao final do filme com mais incertezas do que se tinha ao ver as cenas iniciais ou o trailer

Acabado o filme, não tem como não se pensar no conceito de traição. Quem trai? Há quem julgue que a mera fantasia já constitui infidelidade. Será que todos os desejos devem ser compartilhados e confessados? E o histórico afetivo-sexual deve ser destrinchado quando se entra em uma relação estável, como o casamento? O dito e o não dito, mesmo que sejam só desejos – ou fatos do passado – constituem traição?

O que é lealdade, o que é fidelidade: talvez estes sejam os melhores temas de debate neste filme. Há quem diga que só há traição quando há troca de fluidos; para outras, omitir uma parte significativa do passado, que às vezes se faz presente, já seria o suficiente. Talvez a resposta só seja possível quando se conseguir responder à grande pergunta e desafio: o que é amar?

Last night, de certa forma, mostra pessoas que são tentadas e têm de lidar com suas escolhas. Algumas cenas remeteram à firmeza de Alice/Jane, discutindo com Dan em Closer, afirmando que sempre se pode parar um minuto antes de trair – pelo menos fisicamente. O filme pode ser espinhoso para casais espectadores que estejam passando por uma crise afetiva e não queiram tocar no assunto. E, por outro lado, pode servir aos casais corajosos, servindo como filme-terapia…

Há algum tempo, conversava com um amigo que citou alguém (quem? não lembro!) que disse que o pior da escolha é renunciar às outras possibilidades – muitas vezes, para sempre. Em se tratando de relacionamentos amorosos, talvez seja um dos momentos mais angustiantes. Apenas uma noite lembra muitas outras histórias – vividas ou ouvidas. Joanna e Michael têm de escolher. E qual a melhor escolha? Há alguma ‘garantida’? Na maioria das vezes, sendo bem realista, não… Outras dúvidas surgem: pode-se amar duas pessoas ao mesmo tempo? Enfim, pode-se ampliar a discussão, os questionamentos rendem… Ah, a cena final deixou um gostinho de ‘quero mais’: saí do cinema desejando uma continuação (como Antes do pôr-do-sol, mostrando o que se passa na vida dos personagens, anos depois de suas escolhas…) !

E você? Espero sua opinião!

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Thays Babo é psicóloga e Mestre em Psicologia Clínica pela PUC-RIO

03/06/2012

Luto amoroso – como recomeçar?

A delicadeza do amor  é uma comédia francesa, protagonizada por Audrey Tautou – a eterna e doce Amélie Poulain. Logo de início, o filme nos relembra a imprevisibilidade da vida que, por mais que se queira controlar, não se submete ao nosso querer. Tautou interpreta Nathalie, jovem viúva, totalmente fechada a qualquer novo relacionamento amoroso por três anos, lamentando a perda do marido, que parecia mesmo um príncipe encantado. Dedica-se totalmente ao trabalho, tornando-se workaholic – uma forma conhecida de não lidar com a angústia existencial. 

é importante um tempo para elaborar a morte das pessoas queridas. E quando se trata de um relacionamento amoroso mais ainda, para não refletir nas possíveis relações futuras.

é importante um tempo para elaborar a morte das pessoas queridas. E quando se trata de um relacionamento amoroso mais ainda, para não refletir nas possíveis relações futuras.

Nathalie, totalmente fechada à aproximação de outros interessados, poderia ser um prato cheio para qualquer psicoterapeuta. Porém, a jovem viúva tem valores bem definidos e não cede só por solidão ou carência. Resiste à opinião dos demais e de certa forma ‘banca’ sua escolha. Decididamente, não é uma heroína frágil. Um dia, distraidamente, Nathalie tem um comportamento totalmente imprevisível, não intencional, que provoca uma reviravolta sua vida. Detalhe, esta não era sua intenção. Foi um comportamento totalmente sem atenção – mindless. (Se não quiser perder a ‘surpresa’, nem veja o trailer. Se continuar, tem spoilers à frente…)

O que Nathalie fez? Do nada, beija um funcionário de seu escritório, Markus. Seu subordinado não é charmoso, não se veste bem, não tem um corpo atraente e sempre passou totalmente desapercebido no seu escritório. Markus sequer cogita que tenha sido um assédio – como talvez se passasse com alguém nos Estados Unidos. Pelo contrário: passa a se achar especial e, pelo menos por um dia, vê o mundo a seus pés. Ao descobrir que tudo foi um episódio isolado, em que a chefe não estava com plena atenção, Markus consegue ir em frente. Sua arma principal principal para se aproximar é o seu humor – bem como a sua delicadeza e atenção para detalhes. A partir daí, tudo começa a mudar no escritório em que trabalham.

O estranhamento em torno do affair entre Nathalie e Markus é bem característico da nossa época e sociedade de consumo. Os grupos exercem (ou tentam exercer) influência sobre a escolha amorosa e a ‘patrulha’ de amigos desconsidera muitas vezes os valores individuais das pessoas envolvidas. As pessoas próximas à Nathalie enfatizavam a estética – talvez uma tendência dos franceses – e seu interesse por uma figura tão fora do padrão provoca estranhamento.  Muito se lucra com a  beleza e a elegância, que movem as indústrias da moda, da saúde, da cosmética, dentre outras. Sabemos que homens e mulheres se sacrificam para terem uma aparência de juventude e beleza – desde tempos imemoriais. Assim, se mantêm atraentes e com “valor” no mercado amoroso – e até no profissional. Esta ênfase na estética não necessariamente traz mais felicidade apesar de ser  sabido que a aparência determina, muitas vezes, o prestígio social e sucesso – inclusive profissional (vários estudos apontam a importância da aparência em processos seletivos). Mas também pode gerar endividamento e problemas em consequência a esta obsessão.

Poder ir contra tais padrões de consumo (de pessoas) e apostar na felicidade – totalmente pessoal e intransferível – por conta própria é para poucos. 

O filme completo está disponível no Youtube (fevereiro de 2018).

Superar o luto e, além disto, conseguir ir contra a pressão e à opinião das pessoas amigas é para quem está muito comprometido com seus valores pessoais. Você conhece os seus valores e consegue agir de acordo com eles? Procure ajuda psicoterapêutica para avançar. 

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Thays Babo é  Mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio, na linha de Família e Casal. Tem formação em Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) pelo CPAF-RIO e fez extensão em Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) pelo IPq (USP).

Atende a jovens e adultos em terapia individual ou de casal, no Centro do Rio e em Copacabana
 

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