Em 25 de junho de 2009, o mundo foi surpreendido com a notícia da morte de Michael Jackson. Tantas vezes anunciada, esperei até que a notícia fosse confirmada através de fontes ‘confiáveis’. Afinal, poderia ser uma estratégia de marketing (demasiado ofensiva, mas possível em uma época de crise, para aumentar a venda de música ou de tablóides).
O twitter se revelou como o meio mais rápido de comunicação e, desta vez, acurado, passando a frente de veículos no mundo inteiro. A vendagem da obra deste artista genial, que revolucionou a linguagem pop e inaugurou uma nova era em videoclipes, disparou – infelizmente porque a notícia se confirmou.
Michael Jackson era ídolo até de quem nasceu nos anos 90. A turnê em Londres, anunciada para breve, acendeu a esperança em muitos fãs, do mundo inteiro, de vê-lo ao vivo, para poder cantar e dançar com seus antigos sucessos. Várias gerações foram, de súbito, frustradas.
A tristeza de quem é contemporâneo de Michael Jackson, no entanto, não é só frente ao fim de qualquer projeto do artista, que a morte traz – pois a morte faz parte da vida de todos nós. E sua arte continuará por muito tempo ainda. O que choca é que a morte de Michael é precoce, parecendo anunciada. Quem o viu, ainda menininho, sorridente, ao cantar com os irmãos, se pergunta: como MJ, que obteve sucesso tão jovem, se tornou um espectro de si mesmo, ainda em vida?
Em 2003, um jornalista britânico realizou um documentário que gerou grande polêmica. Sem entrar na discussão sobre a condução do documentário e das intenções do jornalista, o ponto central é assistir ao próprio Michael, contando as agressões que ele e seus irmãos sofreram, quando crianças, no auge do sucesso do Jackson Five. O agressor? O próprio pai.
O documentário mostrou vários outros momentos de Michael com comportamentos totalmente inadequados, compulsivos. Ao mesmo tempo, totalmente ingênuo perante ao seu entrevistador. Pelo que vemos, Michael tentou permanecer na infância – o que já foi de muito discutido, de forma maldosa e pouco compreensiva.
Com todo o seu poder econômico, Michael conseguiu se manter lá e assistimos a isto claramente, na forma com que vai se expondo, sem muita censura. Um cordeiro, na frente de um lobo. Se Michael planejou usar o documentário como estratégia de marketing calculada por ele, planejou mal. Quem deu as cartas ali foi o jornalista.
Partindo de um olhar junguiano, pode-se tentar entender Michael Jackson a partir do arquétipo do puer aeternus: alguém que tem dificuldade de crescer e lidar com a realidade. O caso de Michael Jackson ilustra o que os junguianos denominam de possessão arquetípica.Várias são as formas com que este arquétipo se apresenta e uma delas é o Peter Pan , com quem o rei do pop se identificava totalmente – como ele declara na entrevista. Achava mesmo que era ele. O rancho em que morou até 2005, por exemplo, se chamava Neverland (Terra do Nunca), mostrando a importância da personagem em sua vida. Mas o que o teria feito assim?
Em geral, a Psicologia busca na infância as causas para as psicopatologias (e não há dúvidas de que Michael Jackson sofria de alguns transtornos, mas seria leviano tentar ‘diagnosticá-lo’ aqui, sem tê-lo conhecido pessoalmente, sem ter ouvido sua história diretamente – só mediada pela imprensa, muitas vezes sensacionalista). No caso de Michael, é impossível deixar de atentar para o seu início de vida: foi uma criança artisticamente brilhante, cheia de responsabilidades, que não podia brincar. O crescimento lhe era também doloroso: as espinhas o tornavam feio, perante o olhar do público, como ele conta no documentário. Ao crescer (física, mas não emocionalmente) investe seu dinheiro de forma a assegurar que, pelo menos em casa, poderá continuar brincando. Sobe em árvores, acumula jogos, bonecos e busca a companhia das crianças.
Passa por várias cirurgias, que ainda nos são inexplicadas. Muda radicalmente o seu rosto – em particular o nariz que, segundo conta, o pai criticava duramente. Atribui o embranquecimento ao vitiligo, doença de pele. Tem filhos de uma forma que não fica clara e, pelo que conta no documentário sobre os partos, a relação com a mãe das crianças parece apenas um contrato, sem nenhum envolvimento amoroso.
Fica anos sem trabalhar. Pelo que tem vindo à tona, já praticamente falido, assina um contrato para uma série de apresentações. Não lê o contrato, compromete-se a 50 shows, pensando que eram apenas 10. Enfim, todas estas dificuldades de lidar com aspectos práticos da vida são característicos da pessoa dominada pelo puer.
As investigações pela sua morte continuam e depois da autópsia as circunstâncias do óbito virão à tona. Porém, infelizmente, nunca poderemos saber o que, na verdade, aconteceu na vida de Michael que congelou seu crescimento. Só teremos versões – algumas autorizadas, outras execradas.
A única coisa que podemos dizer é repetir ‘rest in peace’, Michael. Fique em paz.